Injúria racial: equiparação ao crime de racismo
Por muito tempo, injúria racial e racismo não podiam ser assumidas como a mesma tipificação. Para fins jurídicos, a injúria racial referia-se a indivíduos, enquanto que o crime de racismo referia-se a coletivos, contra os quais crimes eram cometidos em função de sua cor e raça; para sermos mais claro, por muito tempo assumiu-se que injúria racial fosse a ofensa, calúnia, discriminação e outras formas de agressão contra uma pessoa, em detrimento de sua cor de pele, enquanto que o racismo seria contra um coletivo. Leiamos o que dizia Art 139, § 3º do Código Penal Brasileiro:“Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena – reclusão de um a três anos e multa.” Destacamos o substantivo “pessoa”, empregado para designar o caráter do objeto do crime.
Neste sentido, a distinção assumida não implicava apenas em entendimentos particulares sobre um e outro ato, mas nas penas para estes crimes, de modo que de um lado estava o racismo. É importante ressaltar que a punição para o racismo era mais severa do que para a injúria racial. Enquanto a injúria racial era considerada um crime de menor potencial ofensivo, com pena máxima de 3 anos de reclusão, o crime de racismo tinha uma pena de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa e de ser inafiançável.
Isto, por razões óbvias, dava abertura às discussões mais acaloradas entre os juristas, dividindo opiniões. E estas discussões acabaram por fomentar novas interpretações e um novo entendimento do STF.
No artigo de hoje falaremos sobre a Lei 14.532/2023, sancionada pelo Presidente Lula, em que os crimes de injúria racial e racismo são euiparados e sobre isso impacta positivamente na luta antirracista. Se você quer entender melhor o panorama legal do direito penal brasileiro sobre essa questão, este artigo é para você. Leia atentamente até o final!
Vamos lá?
Panorama histórico brasileiro: uma história de luta contra o racismo
A história da abolição da escravatura no Brasil é marcada por uma longa luta contra a escravidão e as desigualdades raciais. A campanha pela abolição foi liderada por diversos personagens importantes, entre eles André Rebouças, José do Patrocínio e Joaquim Nabuco.
André Rebouças foi um engenheiro e ativista negro que lutou pela abolição da escravidão e pela igualdade racial no Brasil. Ele participou da criação do Clube da Emancipação, em 1880, que reuniu intelectuais e líderes políticos na luta contra a escravidão. Rebouças foi um dos principais responsáveis pela elaboração do projeto de abolição gradual da escravidão, que foi apresentado ao governo imperial em 1883.
José do Patrocínio foi um jornalista e escritor negro que também lutou pela abolição da escravidão e pela igualdade racial. Ele fundou o jornal "A Cidade do Rio", em 1880, que se tornou um dos principais veículos de comunicação da campanha abolicionista. Patrocínio foi um dos organizadores do Congresso Abolicionista de 1888, que reuniu lideranças de todo o país na luta contra a escravidão.
Joaquim Nabuco foi um político, escritor e diplomata que se destacou na luta pela abolição da escravidão no Brasil. Ele foi um dos líderes do Partido Liberal, que defendia a abolição da escravidão. Nabuco escreveu diversos artigos e discursos em defesa da abolição, entre eles o famoso "O Abolicionismo", de 1883.
O papel dos heróis nacionais citados acima se situa em um panorama maior, em que as leis abolicionistas foram marcando os processos históricos do nosso país. Destaque para a Lei Eusébio de Queirós (1850), que proibiu o tráfico de escravos, e a Lei do Ventre Livre (1871), que garantiu a liberdade aos filhos de escravos nascidos a partir daquela data. A Lei Áurea, assinada em 13 de maio de 1888 pela princesa Isabel, decretou a libertação de todos os escravos no Brasil, encerrando oficialmente a instituição da escravidão no país. A luta pela abolição da escravidão no Brasil está diretamente relacionada à história do movimento antirracista no país. Desde a época da escravidão, os negros foram vítimas de preconceito e discriminação, o que se perpetuou mesmo após a abolição. Ao longo do século XX, diversas organizações e movimentos sociais surgiram para lutar contra o racismo e a desigualdade racial no Brasil, entre eles o Movimento Negro Unificado (MNU) e o Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP). Esses movimentos lutam pela promoção da igualdade racial e pelo fim do racismo estrutural que ainda existe no país.
Lei 14.532/11 de Janeiro de 2023: injúria racial agora é racismo
Em Janeiro de 2023, durante a nomeação de Anielle Franco para o cargo de Ministra da Igualdade Racial, o Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei 14.532 de 2023.
Essa Lei passou a tipificar como crime de racismo a injúria racial e com isso aumentar a pena para reclusão de 2 a 5 anos, além de prever pena de suspensão de direito em caso de racismo praticado no contexto de atividade esportiva ou artística e prever pena para o racismo religioso, recreativo e para o praticado por funcionário público, além de a partir de agora o crime de injúria racial ter se tornado imprescritível e inafiançável, o que antes permitia aos autores do delito responder em liberdade e alegar a prescrição do crime.
Outro detalhe é que o crime de injúria racial foi deslocado do catálogo dos crimes contra a honra, e passou a compor a Lei 7.716/1989.
Esta lei expressa movimentos de lutas sociais que estão enraizados na História do Brasil, haja visto que a distinção entre injúria racial e racismo era duramente criticada por movimentos negros.
É, sem dúvida, um avanço da cidadania e da democracia brasileira!
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